terça-feira, 16 de novembro de 2010

Os do Sucesso.


No céu havia nove luas
E eu nunca mais encontrei minha casa.
Paralamas.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Amuleto

a tua cabeça é um precioso amuleto dentro da minha cabeça.
quando boto meus olhos dentro da tua cabeça, eles ficam rubis.
e o mundo, encarnado apenas como um espanhol sabe sentir:
o mundo fica rojo e, em minhas veias, a seiva das rosas escarlates.

Sim, a tua cabeça povoa a minha cabeça - é o meu planeta.

José Inácio Vieira de Melo in Roseiral.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Alicenações.



Sim. Você é louco, louquinho.
Mas vou lhe contar um segredo: As melhores pessoas são assim.
Lewis Carroll in Alice no país das maravilhas.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Ouça-me.


Bem que você podia pintar na sala
Da minha tarde vazia, meu bem.
Ney

Me diz o que é o sossego.


Caminhávamos, juntos e separados, entre os desvios bruscos da floresta. Nossos passos, que era o alheio de nós, iam unidos, porque uníssonos, na macieza estalante das folhas, que juncavam, amarelas e meio-verdes, a irregularidade do chão. Mas iam também disjuntos porque éramos dois pensamentos, nem havia entre nós de comum senão que o que éramos pisava uníssono o mesmo solo ouvido.
Nenhum de nós queria saber do outro, porém nenhum de nós sem ele prosseguiria. A companhia que nos fazíamos era uma espécie de sono que cada um de nós tinha. O som dos passos uníssonos ajudava cada um a pensar sem o outro, e os próprios passos solitários tê-lo-iam despertado. A floresta era toda clareiras falsas, como se fosse falsa, ou estivesse acabando, mas nem acabava a falsidade, nem acabava a floresta. Nossos passos uníssonos seguiam constantes, e em torno do que ouvíamos das folhas pisadas ia um som vago de folhas caindo, na floresta tornada tudo, na floresta igual ao universo.
Quem éramos? Seríamos dois ou duas formas de um? Não o sabíamos nem o perguntávamos. Um sol vago devia existir, pois na floresta não era noite. Um fim vago devia existir, pois caminhávamos. Um mundo qualquer devia existir, pois existia uma floresta. Nós, porém, éramos alheios ao que fosse ou pudesse ser, caminheiros uníssonos e intermináveis sobre folhas mortas, ouvidores anônimos e impossíveis de folhas caindo. Nada mais. Um sussurro, ora brusco ora suave, do vento incógnito, um murmúrio, ora alto ora baixo, das folhas presas,um resquício, uma dúvida, um propósito que findara, uma ilusão que nem fora - a floresta, os dois caminheiros, e eu, eu que não sei qual deles era, ou se era os dois, ou nenhum, e assisti, sem ver o fim, à tragédia de não haver nunca mais do que o outono e a floresta, e o vento sempre brusco e incerto, e as folhas sempre caídas ou caindo. E sempre, como se por certo houvesse fora um sol e um dia, via-se claramente, para fim nenhum, no silêncio rumoroso da floresta.
Livro do desassossego.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Hellhound On My Trail



Oh baby, don't you want to go?
Oh baby, don't you want to go?
Back to the land of California
To my sweet home Chicago.


Blues falling down like hail, blues falling down like hail.
Robert Johnson


sexta-feira, 20 de agosto de 2010

O jardim das veredas que se bifurcam.


"Todos os caminhos levam à morte. Perca-se."
Jorge Luís Borges.

bunuel.


"Não gosto dos donos da verdade, quaisquer que sejam eles. Assustam-me e me entendiam. Sou fanaticamanete atifanático."
Buñuel.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

mes filmes.

"Como ninguém se interessa pelos sonhos dos outros - mas como contar a própria vida sem mencionar a parte subterrânea, imaginativa, irreal? - não demorarei muito. Dois ou três sonhos ainda, e termino."
Porque antes de Almodóvar, teve ele.

Morin... O Edgar.


Quando interrogado sobre qual a sua máxima de vida:


Que eu lembre, tenho catorze. Catorze mandamentos:

- O contrário de uma verdade profunda é uma outra verdade profunda (eu o retiro de Pascal e Niel Bohr).
- O melhor dos mundos é também o pior.
- Tudo que não se regenera degenera (o que quer dizer, também, que a certeza jamais é alcançada).
- Rir, amar, chorar, compreender.
- Esperar pelo inesperado.
- Lutar em duas frentes.
- Resistir à crueldade do mundo e à barbárie humana.
- Não sacrificar o essencial à urgência, mas obedecer à urgência do essencial.
- Devotar-se ao que propicia paixão e compaixão.
- Manter sempre alerta a razão na paixão e sempre presente a paixão na razão.
- Preservar a revolta na aceitação e a aceitação na revolta (o Muss es sein, es Muss sein, de Beethoven).
- Amar o frágil e o passageiro. ( Amar tudo aquilo que não se verá duas vezes" de Alfred de Vigny).
- "Pensar em aumentar a vida dos seus dias muito mais que os dias da sua vida" ( de Rita Levi-Montalcini)
- Renascer e renascer até a morte.




Pachamama.

E volver das terras incas. E incluir en mí persona a visão de mundo Pachamama.
Incluir não, relembrar.

sábado, 17 de julho de 2010


Memórias, domingos, prazer de haver sido, milagre do tempo que ficou por ter passado, e não esquece nunca porque foi meu...Diagonal absurda das sensações normais, som súbito de carruagem de praça que soa rodas no fundo dos silêncios ruídosos dos automóveis, e de qualquer modo, por um paradoxo maternal do tempo, subsiste hoje, aqui mesmo, entre o que sou e o que perdi, no ântero olhar de mim que sou eu...


Fernando Pessoa - Livro do Desassossego

quinta-feira, 24 de junho de 2010

zanardeando

O sumo do suco do extrato grosso espesso concentrado da palavra leve aérea perfumando o ar onde soa o mar onde ecoa a mar onde escoa a palavra mar onde escorra a palavra porra até o óvulo ouvido da próxima palavra pessoa.

Arnaldo Antunes.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Mointagne me disse ontem à noite:

"Vamos agir portanto e prolonguemos os trabalhos da existência o quanto pudermos, e que a morte nos encontre a plantar nossas couves, mas indiferentes à sua chegada e mais ainda ante as nossas hortas inacabadas".

... e completou: "Em meus escritos alguma coisa fica, em mim, quase nunca."

Chego a achar engraçada a maneira como eu dou muito mais importância aos detalhes pequenos. Minimais. Infinitesimais. Como o velho Leibniz dizia. O determinante não está no grande, mas no detalhe. No minúsculo, no infinitamente pequeno, quase imperceptível.Foi um filósofo que descobriu o cálculo infinitesimal, engenheiros.

Minhas sextas à noite eram passadas desse jeito. E pra mim, fazia sempre tanto sentido.Não precisava de Leibniz para me dar conta disso. Sempre soube.Eu sabia que era amizade quando eu dei aquela festa lá em casa e agente lavou junto o quintal às cinco da manhã e teve toda aquela guerra de mangueira.Eu sabia que era saudade porque o fato da minha tevê não ter Discovery H&H, me lembrava que a sua tinha, e todo vez que eu não colocava naquele canal eu lembrava de você. Nanismo primordial.Quando eu ganhei aquele colar de pérola negra, eu não vi o colar, eu o vi preocupado em saber se eu ia gostar do presente.Gosto muito mais daquilo que meu dinheiro não pode comprar.Ninguém pode comprar um telefonema às duas da manha numa segunda de um amigo pedindo que você converse com ele pra não dormir na estrada.Nem uma crise de riso na mesa de Domingo, com toda família, daquelas que você tenta tomar um copo de coca pra se acalmar e acaba cuspindo tudo pelo nariz, e sua avó passa atrás de você e te manda levantar os braços e chamar São Braz.Quando eu ganho um livro, a dedicatória é sempre tão mais importante que o título.E o cartão é mais importante que o presente.E a viagem é sempre mais legal que o destino.Eu sabia que era amor quando ele pegou aquela mexa do meu cabelo, colocou atrás da minha orelha e meu deu um beijo na testa.Não me faltava mais nada.

É sempre tão pequeno, quase invisível.

outro 16 de junho.

Oh, James Joyce. June 16th.
16 hours.
Ulysses.
Genius.


segunda-feira, 7 de junho de 2010

where the wild things are



Namorados

O rapaz chegou-se para junto da moça e disse:
-Antônia, ainda não me acostumei com o seu corpo, com a sua cara.
A moça olhou de lado e esperou.
- Você não sabe quando a gente é criança e de repente vê uma lagarta listrada?

A moça se lembrava:
- A gente fica olhando...
A meninice brincou de novo nos olhos dela.
O rapaz prosseguiu com muita doçura:
- Antônia, você parece uma lagarta listrada.
A moça arregalou os olhos, fez exclamações.

O rapaz concluiu:
-Antônia, você é engraçada. você parece louca.
Manuel Bandeira

domingo, 23 de maio de 2010

new slang




Baby, deixa eu ser o teu Lamartine Babo
o teu sabonete Phebo
serás o vinho que bebo
meu baião xote xaxado
meu maxixe meu quiabo
baby, vou te dar minha zoeira meu batuque
minha esmola meu smoking
meu buquê meu songbook
o meu look Woodstock
meu rock lóki meu roll

Zeca Baleiro

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Veríssimo




Tu e eu.

Somos diferentes, tu e eu.
Tens forma e graça e a sabedoria de só saber crescer
até dar pé.
Eu não sei onde quero chegar
e só sirvo pra uma coisa
- que não sei qual é!
És de outra pipa
e eu de um cripto.
Tu, lipa.
Eu, calipto.

Gostas de um som tempestade
roque lenha
muito heavy.
Prefiro o barroco italiano
e dos alemães
o mais leve.
És vidrada no Lobão
eu sou mais albônico.
Tu, fão.
Eu, fônico.

És suculenta
e selvagem
como um fruta do trópico
Eu já sequei
e me resignei
como um socialista utópico.
Tu não tens nada de mim
eu não tenho nada teu.
Tu, piniquim.
Eu,ropeu.

Gostas daquelas festas
que começam mal e terminam pior.
Gosto de graves rituais
em que sou pertinente
e, ao mesmo tempo, prior.
Tu és um corpo e eu um vulto
és uma miss, eu um místico.
Tu,multo.
Eu,carístico.

Ès colorida,
um pouco aérea,
e só pensas em ti.
Sou meio cinzento,
algo rasteiro,
e só penso em Pi.
Somos cada um de um pano
uma sã e o outro insano.
Tu,cano.
Eu,clidiano.

Dizes na cara
o que tem vem a cabeça
com coragem e ânimo.
Hesito entre duas palavras,
escolho uma terceira
e no fim digo o sinônimo.
Tu não temes o engano
enquanto eu cismo.
Tu,tano.
Eu,femismo.

terça-feira, 4 de maio de 2010

O livro dos abraços



Assovia o vento dentro de mim. Estou despido. Dono de nada, dono de ninguém, nem mesmo dono de minha certezas, sou minha cara contra o vento, a contra-vento, e sou o vento que bate em minha cara.

Eduardo Galeano

sexta-feira, 30 de abril de 2010




Escrevo e ponto.
Escrevo porque preciso,
preciso porque estou tonto.
Ninguém tem nada com isso.
Escrevo porque amanhece,
e as estrelas lá no céu
Lembram letras no papel.

Paulo Leminsk

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Conhece-te a ti mesmo




Já dizia o oráculo de Delfos. Mas eu não me conheço. Juro que me esforço e faço o melhor que posso, mas não dá. Não dá. Coisa complicada essa de ser humano. E por vezes me olham com um olhar de quem olha o outro que conhece sem nunca ter realmente conhecido: Eu não te entendo.
Eu não me entendo. Procuro me controlar, juro que procuro. Mas não dá. De repente eu estou seguindo a risca meus planos de vida correta, como eu esperava querer, pois havia querido antes e de dentro do meu ser nasce uma vontade que vem subindo o esôfago e não sai pela boca. Leva tudo pra cima, pra minha mente, onde eu não posso forçar o vômito. Ela fica lá e não sai, me doendo.
Vamos estudar, se concentra, foca.
A minha escrivaninha é de frente pro jardim. E as vezes eu olho esse jardim amarelo de sol e penso no mundo todo como meu jardim. E minha mente não me dá paz enquanto eu não tiro o sapato e saio correndo. Meu jardim é o mundo todo e eu não quero ficar em cima desse Código Civil enquanto lá fora tá esse sol todo.
Eu quero ir lá fora. Lá fora, onde tem tudo aquilo que eu não sei o que é. Mas tem. E é demais. Bom demais ou ruim demais. E lá alguém me fala uma língua que eu nunca ouvi e durante tardes inteiras tentam me explicar a lógica da escrita chinesa. E depois me dão uma comida que eu nunca comi e danço uma dança que eu nunca dancei e canto uma música que eu não tenho idéia do que fazer para soar da maneira que soa. E ouço explicações de tantas coisas, me interesso por tudo, não dou nada por certo. E dentro de mim eu estou correndo descalça rumo tudo aquilo que ainda não me é.
E fora de mim eu respiro fundo, fecho a cortina e volto ao artigo 1223. Eu descubro que eu também quero os artigos. Os artigos e o jardim atrás da cortina. Acho que assim dá pra conhecer alguma coisa. Quem sabe até mesmo me conhecer? Mas é só que tem tanto artigo... E é tão raro eu pisar descalça na grama. Eu só estou enjoada, como quem come muito de uma mesma coisa e depois não consegue mais nem por na boca.
Mas há quem diga que eu estou fazendo as escolhas certas para chegar aonde eu quero. Pelo menos não me contem onde é este lugar, perderia toda a graça. Eu não sei onde quero chegar, ou sei e não admito admitir que seja tão diferente do lugar que todo mundo tem em mente. Ou talvez, simplesmente porque esteja errado. Lembro-me que não me conheço. Por agora, acredito em você quando me diz que o melhor pra mim é isso.
Retomo a leitura. Me elogio como forma de estímulo positivo de Piaget: isso mesmo, boa garota. As notas vieram muito boas. Mas é só eu levantar um pouco o rosto que meu jardim ainda está la fora, me encarando. E o meu jardim sou eu mesma e o sol nasce todo dia.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

pessoando



Não sei quantas almas tenho
Cada momento mudei
Continuamente me estranho
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é.

Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas o meu ser
O que segue não prevendo
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
o que julguei que senti
Releio e digo: " Fui eu?"
Deus sabe, porque o escreveu.
Fernando Pessoa

segunda-feira, 12 de abril de 2010

fazenda da vó.

Sussuro sem som
onde a gente se lembra
do que nunca soube.

Guimarães Rosa.

quarta-feira, 31 de março de 2010

remember me.


O que quer que você faça na sua vida, será insignificante.
Mas é muito importante que você o faça.
Gandhi
*Remember me - Holywood me tirando o folêgo.

Apesar de ser um saco ser humano.


Eu não sei se um dia eu vou saber o motivo daquele ato. O que eu sei é que, mesmo me sendo alguém distante, ele me era alguém. Ele me era esses tipos de "alguém" que a tia e a vizinha conhecem porque passou em primeiro lugar em algum tipo de concurso muito concorrido, sempre seguiu as normas, fez tudo como deveria ser feito. E acabou assim, se dependurando em algum lugar dentro da casa, que eu prefiro nunca saber qual foi. Mas sei que vão me contar. Esse tipo de noticia chega tão rápido e demora tanto tempo pra ir embora. Apesar de dever estar preocupada com os pais, irmãos, família em geral (e eu realmente estava), a única coisa que não parava de me atormentar era: ele realmente se matou. Eu já ouvi ameaças como essa ecoarem dentro de mim em certos tardares da noite, e lembro de algum resquício delas em tardes pacatas, mas nunca uma palavra, nem um gesto, nem uma linha chegaram a se materializar.
Não me causa estranheza este tipo de atitude. Sei que somos feito de carne e espírito e que quanto mais espírito e alma se tem, menos nos adaptamos. Alma é a tradução do latim "anima". Desconfie dessas pessoas muito "animadas", tem alma demais lá dentro. Um dia elas ainda vão te chocar. Mas não me lembro dele ser animado. Me lembro dele quieto, mas sempre com um ar sorridente. Não quero tentar adivinhar a razão de um sofrimento tão grande, de tamanha angustia, que termina com um laço em volta do pescoço. Quero apenas dizer que é real. A dor, o choro, o tédio, o desespero. É real demais. E por mais real que seja, agente nunca vai ver. Só nessas horas que tá roxo demais pra tentar alguma coisa.
Como a causa é algo tão subjectivo, e tem intensidades diferentes pra cada um acho que o melhor que eu posso fazer é ser um pesinho da solução. Sei porque, por mais que este mundo consiga alienar nossa consciência, ele nunca vai conseguir alienar a nossa alma. E apesar de a felicidade residir aparentemente numa quantia obscena de dinheiro, não é verdade. É cliché, mas é verdade. É verdade porque eu sei que se eu pedir pra você procurar na sua mente uma das melhores lembranças que você tem, você não conseguiria colocar um preço nela. Nossa alma se alimenta de coisas diferentes do que se alimenta nosso ego.
É é da nossa alma que devemos cuidar, porque ela está lá, persistente, batendo desesperadamente na porta dessa minha rotina mecânica, desses hábitos pré-concebidos, desses sachets cheirosinhos dentra da minha gaveta de meias impecavelmente dobradas. Existe o certo, o errado e existe todo o resto. Se eu não abrir a porta de vez enquando, um dia desses ela acaba explodindo e derrubando tudo de uma vez .
Eu, eu assim, sem disfarce nem fantasia me alimento de coisas banais: de edredons velhos na sala em domingos normais, e toda a família reunida, brigando pra saber que canal agente vai assistir; De risadas de crianças correndo no quintal, risadas, mesmo com o pé sangrando de jogar bola no asfalto; De poesias de amores absurdos, de livros não importantes, de abraços apertados, de dançar até as nove da manha, de ouvir os casos antigos do meu avô, da história de como meus pais se apaixonaram, das fofocas de quem eu conheço, do beijo de boa noite, daquele dia que minha mãe deixou eu escolher dois chocolates no super mercado ( eu só podia escolher um), Do perdão que eu me permiti doar; Daquela vez que ele gritou "eu te amo" bem alto, no meio da cidade, pra ver se a lua me convencia, daquela caixinha de cartas antigas qeu eu guardei, que tá sempre tão empoeirada.

quarta-feira, 17 de março de 2010

Nas voltas do meu coração


Tenho o mal-hábito (inevitável) de tornar aqueles poucos minutos que precedem o sono meu momento de fuga da realidade. Naqueles dez minutos em que sou só eu e meu travesseiro, um quarto escuro e o barulho da televisão ligada na sala parece distante, tenho certeza que a minha alma se desprega de mim mesma. Ela se desprega e sai rodopiando, mirabolando fantasias e planos para aquele corpo preso no mundo sensível. Minha alma vai além. Já estive em tantos lugares nesses dez minutos. Já fiz cursos em Dublin e Nova Iorque. Visitei museus do Cairo e quando virei antropóloga achei a biblioteca de Alexandria. Todo mundo ficou pasmo e foi um reboliço global. Já trabalhei de garçonete na Holanda e fiz projetos na África sobre os Direitos Humanos. Foi por causa disso que eu ganhei um Nobel. Mas foi na Espanha que eu conheci o grande amor da minha vida, e foi sem mais nem menos. Nunca imaginei que seria ele. Mas o meu amor de dez minutos era eterno. Eu também lembrava daqueles momentos em familia, que também precisava da estrada, já que a distância que me separa das pessoas que eu amo variam de uma medida de 300km ao oceano atlântico inteiro. Por isso que gosto tanto das estradas, por isso que o asfalto quente me conforta e a paisagem verde me acalenta. No final daquela estrada, daquele mar, tem alguém. Acho que se agora tenho 20 anos passei 2 inteiros dentro de um carro. E cada ida é uma surpresa, cada volta é uma saudade. Mas a saudade não me importa, já sou imune a ela desde os meus cinco anos quando tive que me despedir e ver a janela do meu quarto ficar cada vez menor, até desaparecer. Eu tinha cinco anos e consciência da dor de nunca mais voltar. De alguma maneira eu sabia que aquela não seria a última vez. E não foi.
Meus dez minutos não são sempre cheios de passagens aéreas e asfaltos. As vezes meus dez minutos viram mil anos quando eu não consigo me desprender. É quando eu dou asas àquele sentimento de individualidade e me apego a mim mesma (que no final das contas, não passa de um amontoado de dúvidas, inquietamento e incertezas, daquelas que corroem o espírito e leva alguém a estudar filosofia.) Meu professor já me disse, se você está conformado, não faça filosofia. Acho que eu nunca vou me conformar . São nestes momentos que o travesseiro fica molhado e eu desejo que nada disso, nem a saudade, nem os prêmios Nobel, nem a palpitação de amar existissem. Jogo tudo fora e viro um corpo. Meu corpo não chora. E depois eu me arrependo e recolho todos os cacos que eu acabei de quebrar e me formo a mim mesma.
Sou assim, um mosaico de cacos que nem sempre eu lembro se foi lembrança vivida ou lembrança sonhada, que colei uma do lado da outra pra voltar a ser eu. Só que na bagunça dessa busca por lembranças não segui ordem cronológica alguma, de modo que numa mesma parte de mim você pode me encontrar brincando de areia com meu pai e em seguida, me ver segurando meu sobrinho, que ainda nem existe. Por isso não me encontro, ou me encontro e me perco tão rapidamente. Não me vejo, não sei se sou, se fui, se serei. Fica tudo rodando nos instantes, nessas voltas do meu coração. Mas não gasto muito tempo com isso, porque no final, não passam de dez minutos.

sexta-feira, 12 de março de 2010

pensamentos de Neruda

Ri-te da noite
do dia, da lua,
ri-te das ruas
tortas da ilha,
mas quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso.

c'était salement romantique - couer de pirate



Só pra aliviar essa febre de França. que não para de disparar meu coração. Tudo bem que ela é Canadense, mas... c'est beau.


Et au sud de mes peines, j'évolue loin de toi
pour couvrir mon coeur d'une cire un peu noire
Que tous les regards lancés à mon égard
J'ai tenté de voler loind de toi
J'ai tenté de voler loin de toi.

sem-teto.



Comes the morning
when I can feel
that there's nothing left to be concealed
Moving on a scene surreal
No, my heart will never
Will never be far from here

Sure as I am brething
Sure as I'm sad
I'll keep this wisdom in my flesh
I leave here believing more than I had
And there's a reason I'll be back

As I walk
The hemisphere
I'got my wish
To up and disappear
I've been wounded
I've been healed
Now for landing I've been
landing I've been cleared
I leave here belienving
More than I had
This love has got
No ceileing

segunda-feira, 8 de março de 2010

resoluções axiomáticas


Não falta mais nada para me convencer de que um rémedio seja, não a melhor, mas a única solução pra essa minha doença. E não vou me contentar com qualquer genérico não. Quero o melhor remédio que exista, daqueles laboratórios estadunidenses ou europeus, com direito a testes ilegais na população africana e licença de fabricação comprada dos poderosos mais corruptos e que possa ser encontrado na prateleira de qualquer farmácia, de qualquer esquina do honesto bairro nobre que eu moro. Somente esse remedio vai me satisfazer. Nada menos.
Cansei de doses homeopáticas que mais incitam do que inibem minha alma de vibrar. Queria tanto que me fosse natural ser comedida. Mas não é. Não é e me dói. Dói com as caracteristicas de cor purpura, densa e quente.
Eu nunca pedi pra ler Lord Byron com dezasseis anos. Me deram como leitura obrigatória Johann Wolfgang von Goethe. Eu sinto como Baudelaire dizia em "Les fleurs du mal". "Tenho lembranças como quem tem mil anos". Essa insaciedade da alma, que não sossega. Essa sede que livro nenhum dá jeito. Me impressiono com os menores detalhes, aqueles bem pequenos, quase invisiveis. E o que é belo me pesa no espirito, fisicamente. A única pessoa que eu vi chorar escutando Requiem de Amadeus Mozart foi meu pai. Eu também não aguntei.

Por esta razão acho que meu exagero sentimental, alma de humano boêmio, com certa dose de libertinagem me seja tão meu. Me é tão meu, todo dia, adivinhar se o vento, o céu e a música que toca estão em harmonia com aquelas nuvens passando...

quinta-feira, 4 de março de 2010

Where is my mind - Pixies


Jurei que não ia ceder novamente. E o mais surpreendente é que foi muito fácil não ceder. Juro que não esperava por isso. Fazia tanto tempo que eu nem lembrava mais que você limpava a casa tomando cerveja e escutando "The doors". Tudo que tinha sobrado na minha memória era a imagem daquela garrafa que você tomou sem mim. Sem ninguém, por sinal.
Todo aquele gosto de Janis Joplin e Bob Dylan às quatro da manha, acompanhado daquele travesseiro que tinha cheiro de H20, e um cabelo bagunçado que bagunçava minha cabeça me era tão distante e tão doloroso que tenho certeza que biologicamente tudo em mim estranhava você.
Tô lembrando de Los Hermanos, "que o esforço pra lembrar, é vontade de esquecer".
Mas eu nunca vou esquecer. Nem que eu me esforce, nem em um século, um mês, três vidas e mais. Só tenho que aprender a guardar você em algum lugar fora das minhas fantasias de Power Rangers vermelhos, cervejas em piscininhas plásticas, banheiros de salão de festas, viagens pra Machu Pichu e filmes da sessão da tarde, aqueles velhos, que agente lembra pra sempre.
Não tenho condições de te guardar em mim. Já tentei, você sempre foi muito espaçoso e folgado. Prefiro lembrar do box embaçado e da caixinha de leite sorridente. E do tanto que eu me esforçava para entender porque eu me esforçava tanto. Eu me esforçava tanto. " Dizem que tô louco, por te querer assim, por te pedir tão pouco, e me dar por feliz". Eu nunca fui sua flor, nem seu bêbe.
Você sabe, na verdade, era mentira quando eu cantava aquela música do Ultraje a rigor " só quero um pedacinho, mas você me dá uma migalhinha". Ououououou Giselda. Eu nunca quis só um pedacinho, e acho que foi por isso que eu nunca fiquei satisfeita com aquelas "migalhas dormidas do teu pão, pequenas porções de ilusão". Só lembro daquela for vermelha do meu vestido que hoje em dia só tem cheiro de sangue pingando.
Prefiro guardar aquela cena do "Clube da luta", com aquela música que você adora, e eu digo pra você com sinceridade, como quem reconhece em si mesmo uma parte que não conhecia, de mão dada com um pseudo-amor, assistindo ao próprio mundo cair:" you meet me in a very strange time of my life".

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

desassossegada

"Há em olhos humanos, ainda que litográficos, uma coisa terrível: o aviso inevitável da consciência, o grito clandestino de haver alma" --Livro do desassossego, Companhia de Bolso, p.58
Era a ocasião de estar alegre. Mas pesava-me qualquer coisa, uma ânsia desconhecida, um desejo sem definição, nem até reles. Tardava-me, talvez, a sensação de estar vivo. E quando me debrucei na janela altíssima, sobre a rua para onde olhei sem vê-la, senti-me de repente um daqueles trapos húmidos de limpar coisas sujas, que se levam para janela para secar, mas se esquecem, enroladilhados, no parapeito que mancham lentamente.

Sortez-les, Tryo!

Donnez-nous du lisse
De la guimauve et du réglisse
Donnez de l'image à bouffer
pré-mâchée et pré-digérée
Donnez-nous du vice
Surlegez nos vieilles idées
Vive mon frigo vive ma télé!